O homem que aprendeu a pausar o tempo

Da Redação ·
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Imagem ilustrativa da notícia O homem que aprendeu a pausar o tempo
fonte: Ilustrativa/Gerada por IA
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Pedro descobriu que o tempo não era uma linha — era uma fita de Möbius.

Voltas que se unem, começo e fim confundidos, como se a vida insistisse em repetir o que não foi compreendido.

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Tudo o que ele tentava deixar para trás voltava pela mesma superfície, só que de outro lado. O mesmo medo, o mesmo incômodo, o mesmo desejo de controlar o incontrolável.

Naquela noite, o ar entre ele e a esposa era feito de espessura.

Não havia briga, só o rumor do que não foi dito.

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Ela se movimentava pela casa com a serenidade de quem está em paz, enquanto ele, por dentro, se partia em tentativas de entender o porquê da distância.

Tentava decifrar o gesto dela, o silêncio, a ausência de perguntas — como se a felicidade dependesse de acertar códigos invisíveis.

Foi então que, sem querer, fechou os olhos.

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E, num sussurro que mal chegou aos lábios, disse a si mesmo:

“Nem tudo o que me atravessa é sobre mim.”

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E o tempo parou.

O relógio continuou a girar, mas as horas deixaram de ter pressa.

A respiração ganhou peso e forma.

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Ele ouviu o próprio coração, esse tambor que insiste mesmo quando o mundo desaba.

A sensação era de suspensão — não o vazio, mas um intervalo onde a vida, enfim, respirava com ele.

Pensou em seu nome: Pedro.

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Pedra.

Aquilo que o tempo tenta desgastar, mas não apaga.

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Percebeu que ser pedra não era ser duro — era permanecer firme o bastante para não se desmanchar por dentro.

Que a rigidez não protege, apenas impede o vento de passar.

E que talvez o verdadeiro segredo fosse aprender a se manter inteiro mesmo quando o mundo não faz esforço para ser gentil.

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A mensagem do chefe ainda estava lá, o texto ríspido, mal interpretado.

Mas agora parecia só um som distante, uma palavra atravessada pelo medo de outro alguém.

Pedro entendeu: o tom dos outros é o eco do que eles vivem, não o reflexo do que ele é.

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Respirou outra vez.

O corpo pesava menos, embora nada tivesse mudado do lado de fora.

A fita de Möbius seguia girando — o tempo continuava o mesmo —, mas Pedro, dentro dela, já não girava junto.

Não era fuga. Era presença.

O poder não estava em parar o mundo, mas em não se perder dentro dele.

Ser resiliente, percebeu, não é suportar tudo, nem fingir que nada dói.

É saber que há coisas que simplesmente não cabem em nossas mãos.

E, ainda assim, escolher não largar a si mesmo.

Quando abriu os olhos, a casa era a mesma, o silêncio também.

Mas agora ele existia dentro do silêncio, não contra ele. Se há dias procurava entender e invejava o silêncio dos outros, aos poucos percebia que também era capaz de lutar contra o ensurdecedor silêncio que mostrava sua fragilidade. Existe muita força em ser frágil.

E pela primeira vez, o tempo — essa fita sem fim — se deitou no colo de Pedro, como se também precisasse descansar.

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