Desde os primórdios da humanidade, quando o ser humano ainda vivia em pequenas comunidades nômades, a necessidade de estabelecer regras era uma questão de sobrevivência. As tribos caçadoras já possuíam normas para dividir o alimento, organizar a caça, proteger os mais frágeis e punir aqueles que colocavam o grupo em risco. Sem regras, o caos e a violência teriam dominado.
Com o passar do tempo, à medida que as relações humanas se tornaram mais complexas, a simples boa vontade deixou de ser suficiente. Surgiu, então, a necessidade de um poder central. Assim nasceram as primeiras formas de Estado: o faraó no Egito, o imperador em Roma, o rei na Idade Média. Todos, de algum modo, representavam a ideia fundamental de que a convivência civilizada só é possível quando há regras claras e uma força legítima para fazê-las valer.
Ao longo da história, a humanidade conviveu com leis justas e abusivas, mas foi o respeito às regras que manteve a sociedade organizada e distante do caos. Hoje, o desafio não é a falta de leis, e sim o desprezo por elas: a cultura do “jeitinho” e a arrogância de quem se julga acima das normas corroem silenciosamente a vida em comum. Muitos veem as regras como um obstáculo e acreditam que a fiscalização é apenas para os outros, revelando um individualismo perigoso que enfraquece a coletividade e transforma o descumprimento da lei em um ato de egoísmo travestido de esperteza.
Um exemplo claro e cotidiano dessa mentalidade está nas construções irregulares. Quantas edificações são erguidas sem qualquer aprovação dos órgãos competentes? Quantos imóveis são levantados sem um profissional ter sequer vistoriado o terreno ou assumido a responsabilidade técnica? É possível imaginar uma casa, um barracão industrial ou um prédio comercial surgindo sem projeto, sem licença e sem acompanhamento profissional? O mais alarmante é que não se trata apenas de pequenas construções ou moradias humildes, mas, muitas vezes, de verdadeiros palacetes, galpões imensos e obras que chamam atenção até do mais distraído observador.
Toda construção, por menor que seja, deveria exibir uma placa de identificação com o nome dos proprietários, dos responsáveis técnicos, do número da licença e das autorizações emitidas pelo poder público. O não cumprimento dessa exigência simples pode abrir espaço para tragédias futuras. O que acontece quando um muro desaba? Quando uma laje cede? Quando um incêndio se propaga em um prédio sem estrutura adequada? A quem recorrer, se nem sequer há um profissional identificado responsável pela execução?
Uma cidade que fecha os olhos para esse tipo de prática acaba se acostumando ao desrespeito e, quando a lei passa a ser tratada como mera sugestão, o resultado inevitável é a desordem. Não existe progresso sustentável sem responsabilidade coletiva. As normas não são caprichos burocráticos, mas os alicerces que sustentam a segurança, a justiça e a igualdade de tratamento entre todos.
Cabe a cada cidadão observar o entorno, questionar, denunciar. Ao ver uma obra nova, pergunte-se: será que essa construção tem aprovação? Existe um engenheiro responsável? Há segurança para quem passa por ali? Se a resposta for negativa, não hesite em comunicar às autoridades. O silêncio diante da ilegalidade é a cumplicidade disfarçada de indiferença. E uma cidade que tolera a desordem, cedo ou tarde, paga o preço em tragédias, desvalorização e perda de credibilidade. A lei não é o problema, ela deve ser a solução. O que nos falta, muitas vezes, é coragem moral para cumpri-la e exigir que os outros também o façam.