Entre narrativas e realidade

Da Redação ·
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fonte: Ilustrativa/Freepik
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A cada novo evento temos que ficar atentos e perceber que certas discussões retornam de forma cíclica. Revisitar meus textos de opinião publicados ao longo dos últimos doze anos é reencontrar essa constante: a necessidade de despertar a sociedade para a realidade das finanças públicas, para além das narrativas fáceis e das paixões de ocasião. Em diferentes momentos, tratei de temas que se repetem como ondas: a resistência social a ajustes fiscais, o incômodo com reformas tributárias, a dificuldade de aceitar que políticas públicas custam dinheiro e que o gasto eficiente não é sinônimo de gasto inexistente.

Em 2013 e 2014 procurei demonstrar matematicamente a relação entre carga tributária, progressividade, justiça fiscal e a própria sustentabilidade das políticas públicas. Esses textos buscavam retirar a névoa ideológica do debate e recolocar o foco no essencial: a sociedade demanda serviços públicos, serviços públicos precisam de financiamento, e financiamento não se materializa sem receita.

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Em 2016 busquei conectar a crise econômica nacional à realidade local. Analisando dados fiscais, indicadores de endividamento e decisões orçamentárias, procurei mostrar como a deterioração das contas públicas não era fruto de um único governo ou de um fato isolado, mas de escolhas acumuladas, adiamentos sucessivos e da crença de que o Estado pode tudo sem que ninguém pague a conta.

Em 2017, voltei a insistir no que muitos preferem não enxergar: a capacidade de investimento do poder público depende de disciplina fiscal. Discuti o impacto de despesas continuadas, a rigidez orçamentária e a dificuldade de financiar políticas estruturantes quando a maior parte dos recursos está comprometida com obrigações inadiáveis. Já em 2018, tratei da necessidade de adotar medidas impopulares, porém indispensáveis, para recolocar as contas em trajetória sustentável, a partir de uma reflexão atual num país que sempre adia o que sabe que precisa fazer.

Em 2019, com o pé de goiaba trouxe a metáfora da improvisação e dos atalhos, evidenciando como soluções paliativas produzem apenas alívio momentâneo e ampliam o problema futuro. Essa linha argumentativa reapareceu em 2022 quando destacando a distorção criada por renúncias fiscais mal planejadas penalizam muitos e reduzem a capacidade do Estado de cumprir suas funções essenciais. Em 2024, buscou-se desmontar o discurso sedutor de que é possível corrigir tudo apenas “cortando gorduras”, sem discutir a base de financiamento, sem rever incentivos, sem enfrentar privilégios e sem avaliar o impacto real das políticas públicas.

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O fio condutor desses textos é direto e desconfortável: a sociedade sempre demanda mais saúde, educação, segurança e infraestrutura e tem razão ao fazê-lo. Porém, é indispensável reconhecer que serviços públicos têm custos e só alcançam eficiência quando há financiamento adequado. Um debate sério não pode ignorar essa relação. Se queremos um Estado que funcione, precisamos exigir eficiência no gasto, avaliação rigorosa das políticas, responsabilidade na gestão e, muitas vezes, aceitar que pagar mais impostos é a consequência natural de desejar mais serviços, desde que haja transparência, justiça fiscal e resultados concretos.

Reafirmo o que muitos dizem há muito tempo: não existe almoço de graça. Todo benefício tem um custo. Cabe a nós decidir se pagaremos esse preço de forma consciente, com controle social, participação cidadã e cobrança por eficiência, ou se continuaremos reféns de narrativas que prometem o impossível enquanto o futuro se deteriora diante dos nossos olhos.

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