Em tempos de desconfiança generalizada com a política e o setor público, falar sobre impostos ainda soa como tabu. Para uns trata-se de um mal necessário e para outros de um fardo injusto. Mas poucos se dão conta de que, para além da carga tributária, existe um componente essencial para o bom funcionamento da máquina pública: a cidadania fiscal. Esse conceito implica em corresponsabilidade, vigilância ativa e consciência de que cada ação individual tem reflexos no coletivo.
Cidadania fiscal é, em termos simples, o exercício da responsabilidade cidadã no que se refere às obrigações tributárias. Ela se manifesta no ato de pedir nota fiscal ao comprar um bem ou serviço, no acompanhamento dos gastos públicos e na cobrança por transparência e eficiência por parte dos gestores. É, em essência, a compreensão de que o dinheiro que financia escolas, hospitais, estradas e segurança pública não vem do nada.
Quando um cidadão exige a nota fiscal de uma compra, está garantindo que aquela operação seja registrada e, portanto, tributada conforme a lei. Pode parecer um gesto pequeno, quase insignificante. Mas é exatamente nessa cadeia de pequenos gestos que se estrutura o financiamento do Estado. Municípios, estados e a União dependem da arrecadação para manter e expandir as políticas públicas. E quando essa arrecadação falha, por evasão ou sonegação, todo o conjunto da sociedade paga a conta, inclusive quem acredita estar “se dando bem” ao não cumprir as regras.
Claro que existem outras formas de financiar políticas públicas. O endividamento é uma delas, mas não é sustentável a longo prazo. Governos que se endividam em excesso comprometem gerações futuras e criam ambientes econômicos instáveis, com altas taxas de juros, fuga de investimentos e perda de credibilidade. A senhoriagem, que é a emissão de moeda para cobrir despesas, é uma tentação perigosa. Em economias em desenvolvimento, como a brasileira, imprimir dinheiro além do necessário desvaloriza a moeda, gera inflação e corrói o poder de compra dos mais pobres.
Em meio a uma demanda crescente por serviços públicos é necessário que os gestores públicos tracem cenários realistas e sustentáveis. Criar programas e projetos para atender demandas momentâneas, sem planejamento de médio e longo prazo, é um erro grave. Pior ainda quando essas ações competem com políticas mais estruturantes, colocando em risco o equilíbrio fiscal e a própria continuidade de serviços essenciais.
Não se trata, portanto, de cortar despesas de forma indiscriminada, como se isso fosse a panaceia da gestão pública. Tampouco é razoável pensar em aumentar a carga tributária de um país já reconhecidamente pesado em tributos. A chave está na eficiência do gasto e na efetividade da arrecadação. É preciso gastar melhor, com mais planejamento, metas claras e avaliação de resultados. É preciso arrecadar melhor, combatendo com firmeza a evasão fiscal e a sonegação, que corroem a base de financiamento estatal e promovem injustiças gritantes.
Precisamos entender que viver em sociedade implica aceitar regras. A fiscalização, nesse contexto, não é uma perseguição ao cidadão ou ao empresário, mas sim uma ferramenta de equidade. Quem paga seus impostos corretamente não pode ser prejudicado pela conivência com quem burla o sistema. A convivência democrática exige equilíbrio entre direitos e deveres e a cidadania fiscal é uma ponte essencial nesse caminho. A verdade é que sem cidadania fiscal, continuaremos girando em falso, cobrando do Estado aquilo que, como sociedade, ajudamos a sabotar.