Ele não percebia, mas ela também não sabia

Da Redação ·
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fonte: Imagem gerada por IA
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A primeira briga aconteceu quando ele não entendeu o que os olhos dela queriam dizer. Como poderia ele saber? De toda forma, ele deveria saber ler o que estava nas entrelinhas, não só o que fosse dito. “Se me ama, tens que aprender a me ler!” – dizia ela enquanto olhava para o horizonte através dos olhos dele.

“Para quem aprendeu a ler com 6 anos, ao 16 já era hora de saber ler pessoas e seus sentimentos”, era isso que ela achava quando dizia que ele parecia não se importar. Ele não se lembrava do dia, mas foi em alguma festa que seu sorriso – ou a ausência dele – na foto se tornou motivo de discussão. Para quem passou a vida – até então – se equilibrando entre tentar ser invisível e rogando para ser notado, seu sorriso nunca tinha sido um problema. Ele aprendera que fazer rir era uma forma de se fazer presente, que levar alegria era uma forma de ser querido. Entretanto, apesar de não ser triste, ele mesmo não sabia rir. Foram anos e anos treinando o seu riso em cada foto e cada olhada no espelho, para que pudesse, enfim, encontrar sua máscara de um sorriso largo, mas talvez tenha se esquecido de buscar os motivos.

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Ele também achou que se a tornasse o centro de seu universo, ela ao mesmo tempo o deixaria orbitar a sua estrela. Não há dúvidas sobre o amor, isso nunca foi o problema. A questão é que não importasse o tempo, em uma orbita sempre se volta ao mesmo lugar. Ano após ano, ele ainda treinava o seu sorriso, tentava a fazer rir para disfarçar a sua incapacidade de sorrir, mesmo com tantos motivos para tal. “Será que eu vim quebrado?” – pensava ele enquanto buscava os motivos de sua incapacidade de não franzir a testa nas fotos.

Ele não percebia, mas os sinais de que o sorriso dela também estava quebrado estavam ali. Talvez por ainda tentar sorrir, ele não tenha percebido que ela não ria mais de suas piadas. Talvez ela nem estivesse mais ouvindo. Talvez ela tenha aumentado demais o brilho de sua estrela e ele não estivesse mais em seu céu. Ele não percebia, mas ela também não sabia, nem o que sentia ou o que queria.

Ela procurava respostas nos cosmos, mas ele ainda olhava pelo velho telescópio. Era como se ela finalmente tivesse encontrado a amplidão do universo, entendendo-se como parte do todo, mais uma estrela em meio a bilhões de estrelas que iluminam o céu. Ele ainda se questionava sobre ser apenas poeira estelar, uma junção do acaso que tornou o caos em vida, na busca entre o existir e o sentido da existência. Ela queria brilhar cada vez mais, ele queria entender como a luz funciona. Não é que ele fosse incapaz de sentir, pelo contrário, ele sentia demais, doía demais, calava demais, pensava demais... nunca foi sobre falta, sempre foi excesso.

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Ele não percebia o que era óbvio, mas já não tinha como perguntar, pois deveria ser... óbvio. Ela também não sabia, o que estava entre o sorriso forçado dele e a testa franzida – ele também tinha olhos, fundos e profundos, silenciados e ainda buscando entender o que os dela queriam dizer.

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