Oposição reage a novo inquérito sobre Filipe Martins, deputado entra com ação contra delegados
O deputado federal Marcel Van Hattem (Novo-RS) anunciou que vai entrar com uma representação contra três delegados da Polícia Federal que passaram a investigá-lo após ele acusar a corporação de produzir "relatórios fraudulentos" sobre o ex-assessor de Jair Bolsonaro (PL) Filipe Martins.
A reação de Van Hattem vem após o governo Trump ter dito que Martins não entrou nos Estados Unidos em dezembro de 2022 - informação que baseou o pedido de prisão contra ele por parte do Supremo Tribunal Federal (STF). Martins ficou preso por seis meses e sempre negou ter saído do Brasil naquela data.
Em nota oficial, o Serviço de Alfândega e Proteção de Fronteiras (CBP) dos Estados Unidos informou, em 10 de outubro, ter realizado uma "revisão minuciosa das evidências disponíveis referentes às alegações de entrada" e concluído que não há registro da entrada de Martins no país na data indicada. O caso segue sob investigação da administração americana.
"Após a conclusão da análise, foi determinado que o Sr. Martins não entrou nos Estados Unidos nessa data", diz o comunicado. "Essa constatação contradiz diretamente as afirmações feitas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, indivíduo recentemente sancionado pelos Estados Unidos por violações de direitos humanos contra o povo brasileiro".
Van Hattem afirmou que tomou a iniciativa de processar os delegados Marco Bontempo, Fábio Alvarez Shor e Luiz Eduardo Navajas Telles Pereira a partir da informação do governo Trump.
"Como ficou comprovada a origem fraudulenta da informação de entrada de Filipe Martins nos Estados Unidos e eu fui indiciado por obra da PF, em particular de três delegados federais, estou também representando contra esses três delegados", afirmou o deputado gaúcho nesta terça-feira, 21.
A oposição bolsonarista na Câmara e no Senado convocou uma coletiva de imprensa para celebrar, de forma irônica, o aniversário de um ano da denúncia do grupo contra Fábio Shor na Procuradoria-Geral da República (PGR) pelos "relatórios fraudulentos". As críticas ao delegado no plenário da Câmara fizeram a PF indiciar Van Hattem.
A PF considerou que as declarações de Hattem configuraram calúnia e difamação, e que seu discurso imputou falsamente crimes ao delegado.
"Nós ingressamos com uma ação para que fosse investigada a conduta do senhor Fábio Shor, sem pré-julgamento. O fato de que este delegado estava insistindo numa situação que a própria PGR havia dado um parecer contrário, ou seja, a favor da soltura de Filipe Martins, porque as provas estavam desmoralizadas", afirmou o senador Rogério Marinho (PL-RN).
Shor foi responsável pelo inquérito que denunciou Bolsonaro e outras 36 pessoas por tentativa de golpe de Estado. Ele virou alvo dos bolsonaristas a partir desse trabalho.
O caso Martins vem se consolidando como o episódio mais polêmico da investigação da trama golpista. Os próprios bolsonaristas avaliam que a suposta fraude possa ter vindo de um servidor da alfândega americana.
Na segunda-feira, 20, a PF pediu a Moraes a abertura de um novo inquérito para apurar se Martins simulou uma falsa entrada nos Estados Unidos em 30 de dezembro de 2022 com o objetivo de "descredibilização das provas" das investigações policiais.
"A rigor, o registro de entrada de FILIPE MARTINS PEREIRA nos Estados Unidos, ainda que em caráter indiciário, revela a possibilidade de que integrantes da organização criminosa, abusando dolosamente das prerrogativas diplomáticas, tenham se utilizado do procedimento migratório diferenciado relacionado a comitivas de chefes de Estado, no qual não há a presença física dos integrantes da comitiva presidencial perante as autoridades migratórias, com a finalidade de simular uma falsa entrada de FILIPE MARTINS em território norte-americano", escreveu a PF.
De acordo com os investigadores, essa circunstância "tem sido utilizada como prática de novas ações de embaraçamento, tomadas como estratégia para descredibilização das provas e das autoridades que atuaram na persecução penal".
"Diante da impossibilidade de esgotar, no presente ofício, todos os elementos envolvidos, e, ainda, considerando a gravidade dos fatos constatados, a Polícia Federal sugere a Vossa Excelência a instauração de procedimento apuratório específico, com o devido compartilhamento das provas já produzidas", propôs a PF.
Quais as provas contra Filipe Martins na trama golpista
Uma das provas da PGR contra Martins é a sua participação na reunião do dia 7 de dezembro de 2022, quando Bolsonaro reuniu o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, e os comandantes das Forças Armadas para apresentar uma minuta de decreto com medidas de exceção. Na avaliação da Polícia Federal (PF), o documento daria sustentação ao golpe.
De acordo com o depoimento do ex-comandante do Exército Freire Gomes juntado pela PGR na denúncia, Martins ficou encarregado da leitura do decreto, expondo os seus fundamentos "técnicos".
Contudo, na fase de oitiva das testemunhas, o general afirmou que não conhecia Martins e não teria como reconhecê-lo. Ele disse em junho deste ano que apenas afirmou à PF que "um assessor" leu a chamada minuta do golpe na reunião do dia 7 de dezembro de 2022, no Palácio da Alvorada.
O depoimento inicial de Freire Gomes, antes da fase oitiva, foi corroborado na delação do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, que informou à PF que Martins se retirou da reunião com os militares após a leitura do documento. "Filipe Garcia Martins Pereira apresentou e sustentou o projeto de decreto que implementaria medidas excepcionais no país", resumiu a PGR ao descrever a participação do ex-assessor na trama golpista.
Os registros de entrada e saída de Martins no Palácio da Alvorada entre o pós-segundo turno das eleições de 2022 e a troca de governo em janeiro daquele ano mostram, segundo a PGR, que ele esteve diretamente envolvido nas articulações golpistas conduzidas por Bolsonaro. O ex-presidente foi condenado a 27 anos e 3 meses de prisão por liderar a organização criminosa. Martins é citado pela PGR em ao menos três reuniões cruciais naquele período.