Azeite, suco, mel e cachaça. Esses são apenas alguns itens de uma vasta lista de alimentos inspecionados todos os dias por auditores fiscais federais agropecuários do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), que frequentemente apresentam irregularidades. Os servidores orientam, fiscalizam, normatizam e regulamentam a sanidade vegetal e saúde animal, garantindo também a qualidade e a segurança de produtos alimentícios que chegam ao consumidor final no Brasil.
Na semana passada, comerciantes, varejistas e atacadistas tiveram que recolher dez marcas de azeites de oliva extravirgem como desdobramento da Operação Getsêmani, que identificou fraude com importação, adulteração e distribuição do produto. São elas, Terra de Óbidos, Serra Morena, De Alcântara, Vincenzo, Az Azeite, Almazara, Escarpas das Oliveiras, Don Alejandro, Mezzano e Uberaba).
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No norte do Paraná, em uma das 11 lojas de uma rede varejista em Londrina, 150 unidades da marca Don Alejandro foram recolhidas na última sexta-feira (15/3). A expectativa é que, após a inspeção nos demais estabelecimentos da rede, sejam apreendidos até 1.200 itens.
De acordo com o engenheiro agrônomo e auditor agropecuário, Fernando Augusto Pereira Mendes, que chefia o departamento de inspeção de produtos de origem vegetal do Mapa, em Curitiba, azeite e bebidas estão no topo das fraudes. “Esses produtos têm alto valor agregado e é difícil identificar a adulteração. Só com um trabalho minucioso envolvendo ações de inteligência e um apoio laboratorial é possível identificar essas atividades ilícitas”, declara.
As apreensões de azeite se intensificaram no Brasil. Em 2022, foram pouco mais de seis mil. Mas, no ano passado, antes das festas de fim de ano, o número saltou para mais de 46.700, sete vezes mais, segundo dados do Mapa. Com a intensificação das ações no mês de dezembro de 2023 esse número chegou a 130 mil litros apreendidos.
A principal causa da adulteração é a adição de óleo de soja ao produto, item seis vezes mais barato do que o azeite de oliva original. Ainda podem ser adicionados na fraude corantes e aromatizantes. “A valorização do produto no mercado nos últimos 12 meses foi superior a 40% no preço ao consumidor, o que estimula a ação de organizações criminosas, que aproveitam essa condição para tirar vantagem financeira e lucrar alto com a venda de produtos adulterados”, explica Mendes.
No final do ano passado, a mesma marca Don Alejandro teve outras duas apreensões feitas numa rede de supermercados no Litoral do estado, em Guaratuba e em Paranaguá. Graças a um trabalho de inteligência, a fábrica clandestina localizada no Rio de Janeiro foi identificada e foi possível rastrear e apreender a mercadoria adulterada encontrada, agora, nos estabelecimentos de Londrina. “Se a rede varejista tem a rastreabilidade do produto, a autuação é direcionada ao fabricante, que está no topo da cadeia. Mas se o comerciante não tem um documento que ateste a origem, ele próprio responde pelo ilícito cometido”, esclarece o auditor agropecuário.
Ele cita os pontos críticos desse tipo de ação cometida pelas quadrilhas, como o prejuízo ao setor produtivo, que sofre as consequências da concorrência desleal, tendo um produto fraudulento, com menor custo de produção, sendo vendido pelo mesmo valor de um fabricado com qualidade. “Mas a nossa maior preocupação tem foco na saúde e na segurança alimentar do consumidor. No caso de alérgicos, essas substâncias derivadas da soja adicionadas ao azeite de oliva podem causar reações graves. Daí a relevância desse trabalho fundamental conduzido pelos auditores agropecuários para identificar e punir esses criminosos”, completa.
Outro produto que faz parte da atuação dos auditores agropecuários é o suco. Foram 97 mil litros de produtos fraudados apreendidos ao longo de 2023 em ações realizadas em todo o Brasil. Aproximadamente 25% do total eram de suco de laranja integral e concentrado. Já o néctar misto de laranja e de maçã representou mais de 50% do volume recolhido. Segundo Mendes, as fraudes nesse tipo de item geralmente estão relacionadas à adição irregular de água e açúcar ao produto.
Apreensão de cachaça e adulteração de mel
Em abril do ano passado, auditores fiscais federais agropecuários apreenderam em Capanema, no Sudoeste do Paraná, o equivalente a quase 28 mil litros de destilados e cachaça numa fábrica clandestina, que funcionava em condições sanitárias precárias e de também com irregularidades no armazenamento dos produtos. Vários reservatórios e garrafões com a bebida foram recolhidos.
Também esta semana, um caso emblemático foi verificado depois que um caminhão-tanque com 32 mil litros de álcool combustível foi apreendido no município de Senhora dos Remédios, no interior de Minas Gerais. Auditores fiscais agropecuários apuraram uma denúncia da utilização do produto como insumo na produção de aguardente de cana-de-açúcar. O estabelecimento comprava o combustível do produtor, adicionava outras substâncias e engarrafava o produto para comercialização. Mas a matéria-prima era irregular. Amostras foram coletadas, o produto apreendido e o proprietário do local foi autuado e vai responder pelas fraudes.
O mel, popularmente reconhecido por seus inúmeros benefícios à saúde, é outro item facilmente adulterado por criminosos, que adicionam sucralose ao produto puro, o que a olho nu não é possível perceber. Cerca de 80% do mel produzido no Brasil é destinado à exportação, especialmente para os Estados Unidos, Alemanha e China. Não somente por ser um produto relevante na balança comercial brasileira, é fundamental assegurar que o produto foi fiscalizado durante sua produção.
Segundo a Delegacia Sindical dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (Affas) no Paraná, esse trabalho de fiscalização se reflete em maior confiabilidade na produção nacional para os mercados externos, assim como garante qualidade e segurança ao consumidor brasileiro, que pode ter certeza de que está adquirindo algo que de fato traz benefícios à sua saúde.
Mobilização da categoria impacta serviços em todo o país
Mobilizados na “Operação Reestruturação” desde 22 de janeiro, auditores fiscais federais agropecuários e técnicos de fiscalização devem intensificar cada vez mais as ações do movimento. Isso porque até agora o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) não avançou nas negociações, justifica o auditor fiscal federal agropecuário, Roberto Siqueira Filho.
Ele explica que a principal reivindicação da categoria é a reestruturação da atividade e a realização de concurso público para reposição do quadro de servidores, com nivelamento de vencimentos com as demais carreiras de auditoria federais e reposição de perdas salariais que se arrastam desde 2015.
O movimento não se caracteriza como greve porque as atividades essenciais de defesa agropecuária continuam sendo realizadas. Porém, não estão sendo cumpridas horas extras não remuneradas e os servidores estão atuando dentro de suas jornadas oficiais de trabalho, o que não é suficiente para atender à demanda de trabalho executada diariamente.
“É fundamental que as autoridades reconheçam a importância do trabalho dos auditores e técnicos de fiscalização e sua contribuição para as exportações e para a segurança alimentar da sociedade brasileira. A atuação dos servidores inibe falsificações e irregularidades, além de impedir que produtos em condições sanitárias inadequadas cheguem aos consumidores”, resume Siqueira Filho.
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